Quando o assunto é gastar dinheiro, a idéia tem que ficar curtindo um bom tempo no bálsamo da indecisão, durante dias, semanas, meses, até que finalmente desaparece ou se transforma nesta sensação insustentável do "é agora ou nunca".
E quando finalmente fui tomado pelo espírito do consumidor compulsivo, quando juntei a coragem necessária para passar pela loja de guitarras e acreditava que toda a minha felicidade dependia disso, quando acreditava que não seria capaz de viver nem um segundo mais se não investisse ao menos uns centavos ali, apareceu aquela roda furada.
Saí da loja com a promessa de voltar uns dias depois para fazer a encomenda. Retirei o carro do estacionamento (Vigo é uma merda para estacionar nas ruas) decidido a pegar a auto estrada para chegar mais cedo à casa se não fosse um simpático transeunte que me indica que tenho a roda quase encostada no chão.
"Puta que o pariu" é a primeira coisa que vem à cabeça em uma situação como estas. "Filha da puta" é a segunda. Nenhum desses sentimentos foram direcionados ao senhor que me avisou e que não tem culpa de nada. Na verdade, se eu voltasse a encontrá-lo deveria agradecê-lo por não permitir que eu atingisse os 100km/h com um pneu neste estado.
Na avenida, a faixa da direita deixa claro que está reservada somente a ônibus e taxis e que não permite a parada de nenhum automóvel avariado. Tempo para desacelerar, sentir que o carro está puxando para um lado, esperar que termine a avenida enquanto penso onde parar sem estorvar o tráfico. Gnomo é assim, pensa nos outros até quando está na merda.
Coloco os triângulos de indicação, separo o pneu de reposição, encaixo o macaco. Tudo sobre controle se não fossem esses parafusos gordos que não são compatíveis com a chave que veio com o carro. Tento, retento e desisto. É o momento de "cagar no vendedor de carros e em todos os seus mortos" (pelo menos é isso que os espanhóis fazem quando estão muito chateados).
Vejo no telefone a salvação (era tão fácil quando podíamos apelar para a experiência dos pais) e ligo para a namorada. Sem o stress da situação, ela pensa mais racionalmente: "liga para o seguro e eles te mandam um mecânico". Explico onde estou e ela põe nomes na minha desorganização: "você está na rotatória Isaac Peral, sentido auto auto-estrada". A segunda pessoa que salva minha pele, mas a essa eu agradeço em casa.
Ligo para o seguro, a atendente tenta convencer-me de que eu posso trocar o pneu sozinho, eu tento convencê-la que não tenho a ferramenta adequada. Seguramente ela "cagou em mim e em todos os meus mortos", mas eu não me importei, já que tinha em mente que ia repassar toda esta merda ao vendedor de carros. Desligo o telefone e espero.
O mecânico chega com o caminhão do guincho. Se ri quando eu digo que a chave é menor que os parafusos e me diz que estes vêm com uma proteção anti-roubo. É só tirar a proteção que os parafusos estão aí, totalmente compatíveis com a minha chave. Vergonha por comprar um carro e não saber como trocar seu pneu. Buscamos a ferramenta que teoricamente tira a proteção dos parafusos, mas ela não estava ali. Juntos, nós dois "cagamos no vendedor e nos seus mortos" e isso nos criou um laço de cumplicidade e companheirismo. Por sorte o mecânico tinha uma chave de fenda e resolveu o assunto com ela.
domingo, 5 de outubro de 2008
A saga da guitarra e dos pneus furados - Parte I
Publicado por Gnomo en 21:53
Etiquetas: Vida de Gnomo
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5 comentários:
Que história heim!
Mas, o que é "cagar no vendedor e nos seus mortos?"
Fiquei curiosa e pensando na cena, que seria engraçada! hhaha... bjs!
Oi Lêêêêê!!
Saudades, irmão querido!! Quer dizer que vc esqueceu de ler o manual?? Outro dia eu comentei com o André que o pólo também não tinha vindo com essa peça que tira o parafuso anti-furto no carro, mas não é que o meu não tem...afinal o nosso carro só tem as calotas e não as rodas...hehehe
Pois é, o problema maior - para nós homens - disso tudo é o "orgulho" ferido. Isso normalmente acontece com elas ... hehehe ... brincadeirinha ... desculpa ...
Mas como sempre digo, tem que ter estória pra contar ...
Abração,
Amauri
Dá até a impressão de que estou vendo: Um sol de rachar, os carros passando, e o peneuzão lá, pedindo arrego. E, na hora que se precisa, não se acha nada. Bem que poderia ter passado uma Senhora para te ajudar, né?
Vale tudo para sustentar a GAS!
Essa historia me lembrou uma outra que ocorreu aqui em Dubai, quando abastecemos um carro (alugado) a Diesel com gasolina (fomos informados que o carro era a gasolina).
46 graus a sombra e esperando por socorro com o padrao de qualidade arabe ...
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